Memórias

Não tenho uma memória muito boa, mas com comida é diferente. Lembro que quando eu era criança a minha maior aliada gastronômica era a Dagmar, nossa beagle gulosa. Graças a ela eu podia reservar lugar no meu estômago para o que realmente interessava! Ela ficava debaixo da mesa e recebia, de muito bom grado, os bifes ultra bem passados que eu não suportava comer e os restos de bolachas "desreacheadas" por mim!
Minhas primeiras incursões na cozinha foram para fazer pirulito de açúcar queimado e quanta queimadura sofri! Os adultos ao meu redor nem ligavam, é queimando que se aprende! Logo fui aumentando o repertório, aprendi a fazer brigadeiro e algum tempo depois crepes. Era meu jantar favorito, começava com as de queijo derretido e terminava com as recheadas de brigadeiro com sorvete. Logo mais comecei a fazer meus próprios ovos fritos para que ficassem do jeito que eu gostava, com a clara cozida e a gema mole que eu comia com batatas fritas. Adorava junkie food. O Macdonald's estava entrando no Brasil e achávamos aquilo o máximo. As festas de aniversários eram feitas lá e todos sabiam cantar o mantra: dois hamburgueres, alface, queijo, molho especial, cebola, picles, num pão com gergelim! Parecia que tínhamos sofrido lavagem cerebral! E a moda dos chicletes bubble gum de melância, que também aromatizavam o ambiente! A hora do recreio era um festival de porcaria à parte, paçoquinha Amor, chocolate Sufflair, Sonho de Valsa, sorvetes Esquimó, Puxa-Puxa, bala 7 Belo, e tantas outras... Verdade seja dita, eu também tinha um lado sofisticado, não era levada a muitos restaurantes, mas adorava os que frequentava, como a churrascaria Rodeio, o japonês Suntory com seu jardim encantado e o saudoso italiano Gambino! O Gambino era especial, pois lá eu podia ir sem a companhia de adultos, apenas com meus amigos (isso aos 8 anos) e era uma das coisas que mais gostava de fazer na vida! Adorava aquela saladinha com molho de roquefort, o carpaccio que meu pai me ensinou a comer, as pizzas de massa finíssima e crocante, e claro, a sobremesa: cassata de nata com cobertura de chocolate! Às vezes pregava uma peça em alguma amiga: depois que ela já tinha comido o carpaccio eu falava que era de feito de carne de lagarto, até mostrava no cardápio e ainda confirmava com o garçom! Que sádica! E durante anos o restaurante mais chique que eu conhecia era o francês La Tambouille, que eu adorava e sempre citava como meu preferido. Lá comíamos salada verde com kani kama (!!!) de entrada e como prato principal: camarões empanados com catupiry!!! Dá pra ser mais 80's? Quanto a ingredientes as opções eram escassas, ninguém temperava salada com vinagre balsâmico, azeite de trufas e flor de sal. Salmão defumado, caviar, mostarda Dijon, foie gras e outras delícias só trazendo do Free Shop depois de uma viagem internacional. Realmente, quando eu era criança a gastronomia de São Paulo também era. Como evoluímos!

No comments: